sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

BAHIA DE TODOS OS INCENSOS


Hoje é sexta – feira, dia de todo bom baiano incensar a casa.
Além do mais,é sexta – feira do Bonfim,festa de Oxalá,nosso santo maior,a secular igreja ,lotada,fiéis de branco,almas em adoração,pedindo,principalmente paz.
O costume de incensar as casas  é antigo e não nasceu aqui.A origem da defumação vem das plantas votivas dedicadas aos deuses pedindo proteção contra as adversidades.Certos perfumes fazem fugir as forças do mal.As bruxas da Idade Média,na Europa, os vampiros ou nossos sacis,caaporas e curupiras detestam o cheiro do alho,cravo ou alecrim.A fumaça da palha benta,no Domingo de Ramos,evita tempestade e  faz parar a chuva.Queimar essências,raspas de raízes,folhas,sementes e plantas odoríferas,como o manjericão,era parte fundamental nas oferendas aos deuses para angariar bons fluidos e afastar o mal.
A prática de incensar a casa ,tão comum no Nordeste,teve origem na”fumigatia”  oblacional romana,como uma forma de deixar a maldade e a adversidade extra-muros da casa do crente.A igreja católica também usa com freqüência o incenso nas cerimônias religiosas,sobretudo para cercar os mortos insepultos”Deinde incenset corpus defuncti,et  tumulum”.
Para inveja,olhados,quebrantos e malefícios diversos,as velhas feiticeiras aplicam no “prejudicado” defumadores de cascas de alhos,raspas de chifre e palhinhas e lixo encontradas nas encruzilhadas,um porrete para qualquer trama diabólica sobrenatural.Também existem defumadores de cupim,pena de galinha preta;de outra cor,não serve.
Acompanha a oração:
Nossa Senhora defumou o seu bento filho para cheirar;eu defumo você para sarar.Repete-se três vezes,pois o número três é o número do mistério;esta oração portuguesa é antiqüíssima,perde-se na noite dos tempos.

Em Salvador,chova ou faça sol,nos pontos de ônibus,nas ruas do centro,na estação ferroviária,sempre tem alguém vendendo defumador,geralmente um velho de barba crescida e muito saber.O incenso e o defumador nunca se misturam;cada qual no seu cada qual,ensina m as mulheres de saia,senhoras  dos preceitos e segredos.O cheiro do defumador nem sempre é bom;já o olor do incenso agrada a todos,nos enche de paz e de alegria.Antigamente,sábado era dia de incensar a casa.Sempre quando os sinos tocavam as ave-marias.O cheiro gostoso do benjoim,da alfazema,da mirra,do alecrim, do capim santo subia até o Trono do Altissimo,enchendo o céu de odores aromáticos.Incensava-se o nicho dos santos,o guarda-vestido,os quartos,as salas trazendo consigo um cheiro de santidade.
Como um dos Reis Magos trouxe incenso para o menino,nos tempos de outrora toda criança era recebida com incenso;a vizinhança sabia que tinha chorinho novo no bairro;quem teria coragem de pegar uma criança novinha para vestir sem antes incensar as próprias mãos,a roupinha,a fralda,para ficar tudo bem cheirosinho?O berço cheirava a incenso e alfazema.
Tinha que saber onde comprar o incenso para evitar misturas ou falsificação,pois,gente não é gente.O homem das ervas,que vendia folhas,ele mesmo,criatura de preceito,era o mais indicado,profundo conhecedor de folhas e remédios.
Havia incenso nas igrejas,nas novenas e trezenas,no mês de Maria,nas festas caseiras,no romper da Aleluia.para afugentar o demônio,as ruas cheiravam a pureza,o ar era leve.
Mas,nem só para alegrias ou chegadas usava-se o incenso;também para tristezas e partidas.Também estava nos velórios e sentinelas;quando o defunto saía para sua derradeira morada,depois de tudo varrido e o cisco jogado porta a fora,atiçava-se as brasas do caco,colocava-se uma mistura de incenso e alfazema e purificava-se o ambiente.Depois,jogava-se as brasas na rua para confundir o morto.
O incenso é de Deus.Trás paz e alegria.Seu cheiro gostoso deixa a casa  com  um ar de suavidade e tranqüilidade.

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