CUÍCA DE SANTO AMARO
Um cronista do cotidiano, mistura de trovador e repórter, infernizou a vida de Salvador, Bahia, dos anos 40 aos 60.
Batizado de José Gomes, foi com a alcunha de Cuíca de Santo Amaro que se celebrizou como um dos personagens mais importantes da história recente da cultura baiana.
Seus versos virulentos assustavam poderosos e gente comum, e não havia segredo guardado a sete chaves que escapasse do seu faro para escândalos, que tornava públicos na cidade através de cordéis.
Este foi, ao longo da vida, o seu ganha-pão. Venal para uns, genial para outros, uma coisa,
porém, ninguém nega: este personagem do século passado mantém uma atualidade singular, que não se insere em nenhum rótulo. Conheci José Gomes, o famoso Cuíca de Santo Amaro, cordelista respeitado, em Salvador. Fazia ponto no Elevador Lacerda e era uma figura conhecida e amada pelos baianos. Foi uma espécie de reporter e cronista do cotidiano da Bahia. Era muito querido e respeitado; sobreviveu até a morte, da venda dos seus cordéis, vindo a falecer em 1964.
Aparecia um fato intrigante, um marido traído, uma fofoca de patrão com a empregada, um assassinato, a mulher de Brotas (que capou o marido), logo, logo, lá estava Cuíca com seu cordel a verberar na fila do Elevador Lacerda, ponto mais movimentado de Salvador. E sua freguesia era fiel.
Texto de Ricardo de Benedicts,escritor e ativista literário,fundador da APOLO.
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TIPOS POPULARES DA VELHA BAHIA
PROFESSOR GUSMÃO
Não foi do meu tempo pois essa estória é bem antiga
dos tempos da minha avó.
Ninguém conhecia sua origem ,profissão ou educação,mas,era chamado professor ,por toda gente.Talvez devido á sua
grande erudição.
De tudo sabia, discorria sobre qualquer assunto, de
política á vida alheia.
O certo é que,apesar de aluado tinha o respeito da
comunidade pois o baiano admira o saber .
Minha avó o descrevia como um tipo alto,canhestro,
sempre com um livro debaixo do braço.
Assim percorria toda a cidade sempre
falando e discursando coisas sem nexo ou dizendo bobagens , ás vezes com algum fundo de
verdade.
Adorava os festejos de Dois de Julho.
Subia sem cerimônia no palanque armado no Largo de Santo Antonio batendo
palmas , recitando versos de sua autoria ou narrando fatos históricos onde
louvava nossos heróis com reverencia e
denodo.
Mas do que ele gostava mesmo era de polemizar sobre literatura.Comprava
muita briga e não respeitava patente.
Aproveitava o espaço que Aloísio de Carvalho, o
famoso Lulu Parola ( poeta satírico dos
melhores desta terra) , lhe dava no seu importante Jornal de
Notícias para provocar outros poetas
iguais a ele,chamados “poetas de água doce” que era como o povo denominava os
maus poetas. Nesta terra de Gregório de Matos, Castro Alves e Artur de Salles
as pessoas não tinham muita paciência com versos de pé quebrado,como se dizia.
Sua discussão com Manoel Tolentino, outro poeta de
rua,ficou famosa.
O Tolentino publicou no jornal esses versinhos contra
o Professor:
A onça, bicho feroz,
Que tudo come ou devora
Pegou professor Gusmão,
Mastigou e...jogou fora.
Exasperado,o Professor nunca perdoou o colega e o perseguiu com versos até o fim
da vida.
MALUCO BELEZA
Não me recordo de tê-lo conhecido,mas,uma amiga dez anos
mais velha,lembra-se bem dele.
Existem dúvidas se era realmente maluco ou apenas um
excêntrico irreverente.
O importante nesses tipos populares é a
sua perenidade,imortais à sua maneira torta,pois,nunca são esquecidos pelo
povo.Incorporam-se ao folclore da região e atravessam séculos.
O Maluco Beleza
era um desses tipos engraçados que divertiam a todos.
Seu ponto favorito era a Ladeira do Taboão onde sempre
fazia um arremedo de comício para a multidão que se postava ao seu redor.
Tinha uma cabeleira enorme,desgrenhada e uma cara de
poucos amigos.Era um monarquista de
carteirinha e recitava catilinárias contra a República, que achava coisa do
demo que só iria trazer destruição para o povo brasileiro.
Fazia questão de esmiuçar cada um dos erros do novo
regime e tentava açular o povão contra os políticos republicanos e suas idéias
erradas.
Como levava muito a sério o que fazia e tinha um jeito
todo especial de inflamar a multidão, a polícia comparecia sempre e acabava a
igrejinha a fios de espada e patas de cavalos.
,A multidão se dispersava ,o orador
ia direto para a Casa de Correção de onde saia impávido no dia seguinte
para começar tudo de novo, a garrafa de branquinha pendendo da sua mão
esquerda.
Muitos anos mais tarde,um gênio também
rebelde,inconformista e inconformado,ostentando uma cabeleira cacheada,mimoseou
a Bahia com suas músicas e seu estilo inconfundível de viver.Também foi chamado
de Maluco Beleza e também jamais será esquecido apesar de ter nascido há dez mil anos atrás.Chamava-se Raul
Seixas. E não havia nada neste mundo que não soubesse demais...
Nota: Na falta de uma imagem do Maluco Beleza de outrora,coloquei uma caricatura do Maluco Beleza de hoje,o imortal Raul seixas.
Classifico o conteúdo como uma mensagem única e verdadeira homenagem aos queridos irmãos Baianos;ao tempo que a dedico particularmente ao meu
ResponderExcluirIr.: RMC. 02/02/2015 > MRS.: