A VIDA NAQUELES TEMPOS!...
Quem casa quer casa,mas,vai morar em apartamento.Não na Bahia de antes da Segunda Guerra.Havia casas de todos os tamanhos para todos os bolsos.
Família de classe média recusava-se a morar num primeiro andar em cima de casa comercial,fosse farmácia,armazém ou padaria;não era bem visto e o chefe da família daria nó em pingo d’água prá não submeter sua gente a esse vexame
.A pobreza remediada vivia em pequenas moradias com um jardinzinho na frente,onde não faltavam palmeiras e pés de buganvília ou,roseiras carregadas de flores brancas e olorosas.Ao fundo,um pequeno quintal com mangueiras plantadas onde se colocava a rede para a sesta do dono da casa.
Não raro,o banheiro era construído lá também,fora do corpo da casa,nem sempre azulejado,pois,ninguém ligava para luxos naqueles tempos onde banheiro era para se banhar e para as necessidades vergonhosas do ser humano.
Havia um vaso(quando havia,a maioria das vezes era um buraco no chão,uma espécie de fossa,coberta com um tampo de madeira).Papel higiênico era luxo inexistente,a família servia-se de folhas de árvores ou papel de jornal:
Jingobel,jingobel
Acabou papel
Não faz mal, não faz mal
Limpa com jornal.
O banheiro podia ser precário,mas,toda casinha que se prezasse,tinha que ter sala de visitas,com sofás e poltronas,uma mesinha de centro com jarro de flores naturais cortadas cedo no jardim ou quintal,tapetes e cortinas,além da escarradeira e do porta chapéu.Todos os homens andavam de chapéu e algumas mulheres também.Crime de lesa majestade era um cidadão entrar numa casa de família com um chapéu na cabeça;era muita desconsideração com o chefe da família.Conheci um velho que gritava logo,mau humorado:
-A casa é de pobre,mas,o telhado não está furado,prá vosmecê entrar aqui sem tirar o chapéu.
As visitas de cerimônia eram recebidas na sala; conversavam , tomavam café ou chá com bolinhos ,ou comiam um doce de calda;podia ser feito com as suculentas goiabas,os dourados cajus ou até da jaca ou de leite, sempre preparados pela dona da casa;mas,nunca doce de banana,que se dizia era o doce servido nos “castelos”,ou seja casas suspeitas.O refresco de umbu ou cajá acompanhavam os doces.
A sala de jantar era onde a família se reunia entre si ou com os mais íntimos,”ratos de casa”,como se dizia dos amigos chegados ou aderentes.Tinha uma grande mesa redonda ou quadrada,cadeiras simples ou de espaldar alto,dependendo da posição social do dono da casa,que invariavelmente se sentava á cabeceira,se a mesa fosse quadrada.Um guarda louça enorme ou guarda comida,cheio de gavetas e portas completava a mobília.Como quase ninguém tinha geladeira,colada á sala e perto da cozinha,ficava a despensa.Lá se guardavam os mantimentos.
A cozinha era o reino da dona da casa e suas filhas mulheres.O grande fogão á lenha não podia faltar e era o centro das atenções.Havia sempre uma chaleira de água quente sobre ele no fogo sempre aceso,a lenha crepitando ,criando um ar domestico inesquecível.Não esquecer do forno feito de alvenaria,(bem como o fogão,)com a sua enorme boca escancarada onde se assava o pão caseiro e o peru de natal ou das grandes ocasiões.Era uma pobreza limpa,decente,sem móveis luxuosos ou aparadores caros,porém ,não faltava o necessário ao bom convívio,nada mesmo,nem o respeito.
As casas mais simples podiam ter dois ou três quartos,o do casal,com sua larga cama de madeira maciça e colchão de barriguda,onde eram feitos e nasciam os filhos do casal,nas mãos de uma “aparadeira”, pois médico era luxo para poucos.
Olhando para trás,não sei porque,me parece que as pessoas eram mais felizes.Reinava a disciplina e o respeito.Os filhos,tivessem a idade que tivessem,tomavam a benção aos seus pais e ouviam as singelas,mas,potentes palavras:-Deus te abençoe,meu filho,te proteja e te guarde.
Acho que as pessoas se sentiam mais fortalecidas.
*Este e muitos outros textos sobre a vida na Bahia,antigamente,estão no livro "A Bahia de Outrora",desta autora.